CAFÉ DE SUBÚRBIO (14)
Já não há mármore na mesa,
Onde o poeta ou o pintor
Esboce um verso, um traço de beleza:
Dê um sinal de si, se for.
Lembro os perfis desses clientes,
Debruçados no espelho do tampo claro e liso,
Como se vissem aflorar, em águas doentes,
Ainda impreciso, um rosto de Narciso.
E o lápis vagueava, a imaginar o rumo
Da voz que só em nós se sente e escuta,
A expandir-se da névoa, entre névoas de fumo,
No crispado da escrita, na lânguida voluta.
Eles, rostos de boémia, o chapéu desabado.
Na xícara, o café a arrefecer da espera.
E o mármore feliz de se ver violado!
E um frémito, em redor, da Primavera!
Acabados o café e a inspiração,
Lançavam para ali o cobre da despesa.
Logo vinha o criado (era criado, então!),
Arrecadava o cobre e, sem hesitação,
Limpava todo o oiro do mármore da mesa.
António Manuel Couto Viana
(1923 – 2010)
As escadas não têm degraus, nº4
(Cotovia, 1991)
Já não há mármore na mesa,
Onde o poeta ou o pintor
Esboce um verso, um traço de beleza:
Dê um sinal de si, se for.
Lembro os perfis desses clientes,
Debruçados no espelho do tampo claro e liso,
Como se vissem aflorar, em águas doentes,
Ainda impreciso, um rosto de Narciso.
E o lápis vagueava, a imaginar o rumo
Da voz que só em nós se sente e escuta,
A expandir-se da névoa, entre névoas de fumo,
No crispado da escrita, na lânguida voluta.
Eles, rostos de boémia, o chapéu desabado.
Na xícara, o café a arrefecer da espera.
E o mármore feliz de se ver violado!
E um frémito, em redor, da Primavera!
Acabados o café e a inspiração,
Lançavam para ali o cobre da despesa.
Logo vinha o criado (era criado, então!),
Arrecadava o cobre e, sem hesitação,
Limpava todo o oiro do mármore da mesa.
António Manuel Couto Viana
(1923 – 2010)
As escadas não têm degraus, nº4
(Cotovia, 1991)
1 comentário:
Obrigada César
Haja uma magnólia que alimente esta alfazema, por vezes tão murchinha.
beijo
mila
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