29.11.08

InCêndio que nos afoga


fingir que está tudo bem: o corpo rasgado e vestido
com roupa passada a ferro, rastos de chamas dentro
do corpo, gritos desesperados sob as conversas: fingir
que está tudo bem: olhas-me e só tu sabes: na rua onde
os nossos olhares se encontram é noite: as pessoas
não imaginam: são tão ridículas as pessoas, tão
desprezíveis: as pessoas falam e não imaginam: nós
olhamo-nos: fingir que está tudo bem: o sangue a ferver
sob a pele igual aos dias antes de tudo, tempestades de
medo nos lábios a sorrir: será que vou morrer?, pergunto
dentro de mim: será que vou morrer? olhas-me e só tu sabes:
ferros em brasa, fogo, silêncio e chuva que não se pode dizer:
amor e morte:
fingir que está tudo bem:
ter de sorrir: um
oceano que nos queima, um incêndio que nos afoga.

JLP

22.11.08

Poema de uma tarde só


Não tenhas medo do amor.
Pousa a tua mão devagar sobre o peito da terra e sente respirar
no seu seio os nomes das coisas que ali estão a crescer:
o linho e genciana;
as ervilhas-de-cheiro
e as campainhas azuis;
a menta perfumada para
as infusões do verão e a teia de raízes de um
pequeno loureiro que se organiza como uma rede
de veias na confusão de um corpo.
A vida nunca
foi só Inverno, nunca foi só bruma e desamparo.
Se bem que chova ainda, não te importes:
pousa a tua mão devagar sobre o teu peito e ouve o clamor
da tempestade que faz ruir os muros:
explode no teu coração um amor-perfeito,
será doce o seu
pólen na corola de um beijo,
não tenhas medo,
hão-de pedir-to quando chegar a primavera.
(Maria do Rosário Pedreira)

20.11.08


Os abraços... Ah! Como faltam os abraços, aqueles prolongados, inteiros, coração com coração, palpitações se misturando numa entrega de sentimentos, desejos, medos e sonhos...

Abraçar é se dar ao outro como um conforto, um alento, uma esperança. Abraços mudam a nossa vibração; são capazes de transformar uma vida toda de tristezas e abandonos.

18.11.08

E se Obama fosse africano?



Mia Couto escreveu...


Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.
Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.
Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de "nosso irmão". E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros? Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.
Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: " E se Obama fosse camaronês?". As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.
E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?
1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.
2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.
3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes. O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos. Convenientemente "descobriram" que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado 'ilegalmente". Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política...
(...)

5.11.08

God bless Black America


Obama é Presidente.
Disse ele ontem:
"Esta eleição contou com muitas histórias que se irão contar durante várias gerações. Mas aquela que eu hoje trago comigo é sobre uma mulher que depositou o seu voto em Atlanta. Ela é muito parecida com os milhões que aguardaram vez para que a sua voz fosse ouvida nesta eleição, à excepção de uma coisa: Ann Nixon Cooper tem 106 anos.
Ela nasceu apenas uma geração depois da escravatura; numa altura em que não havia carros nas estradas, nem aviões no céu; em que alguém como ela não podia votar por duas razões - porque ela era mulher e por causa da cor da sua pele.
E hoje, penso em tudo aquilo que ela viu ao longo do seu século de idade na América - as dores de cabeça e a esperança; a luta e o progresso; os tempos em que nos foi dito que não podíamos, e as pessoas que empurraram o credo adiante: "yes we can".
Quando havia desespero [...] e depressão em todo o país, ela viu uma nação conquistada pelo medo, com um New Deal, novos trabalhos, uma nova sensação de objectivo comum. 'Yes we can'".
Quando as bombas caíam no porto [Pearl Harbour] e a tirania ameaçou o mundo, ela era testemunha de uma geração que emergia à grandeza e de uma democracia era salva. 'Yes we can'".
Ela esteve lá para os autocarros em Montgomery, para as mangueiras em Birmingham, a ponte em Selma, e para um pregador de Atlanta que disse às pessoas que elas conseguiriam triunfar. 'Yes we can'".
Um homem tocou na lua, um muro caiu em Berlim, um mundo ficou ligado pela nossa ciência e imaginação, 'Yes we can'".
E este ano, nesta eleição, ela tocou com o dedo no ecrã e votou, porque ao fim de 106 anos de América, ao longo das melhores horas e das horas mais sombrias, ela sabe como a América pode mudar. 'Yes we can'".
América, fizémos um longo caminho. Vimos tanto. Mas ainda há tanta coisa a fazer. Por isso, esta noite, vamos perguntar a nós próprios - se as nossas crianças viveram para ver o próximo século; se as minhas filhas tiverem a sorte de viverem tanto como a Ann Nixon Cooper, que mudança é que vão ver? Que progresso teremos nós feito?".
Esta é a nossa oportunidade de responder a essa pergunta. Este é o nosso momento. Este é o nosso tempo".

4.11.08

A GALA ...........Alguns momentos



Lisboa Não Sejas Francesa

2.11.08



Sandra Nogueira, Emília Pinto, Inês Sousa

1.11.08



Emília Pinto, Ricardo Soler, Helena Vieira, Paulo Cardodo


Emília Pinto, Alexandra Lencastre


o público


Carlos Pinto Coelho, Emília Pinto, Paulo de Carvalho

Magos Contos


A pedido dos autores (eu sou um deles), informam-se os interessados que a primeira apresentação do livro A FAZER DE CONTOS terá lugar na cidade de Coimbra no próximo dia 12 de Novembro, pelas 18H00, na sede da Coimbra Editora (ao Arco d'Almedina). A apresentação estará a cargo do escritor, poeta e jurista António Arnaut