17.1.10

O meu silêncio pelo Haiti



do blog - A vida é uma magnólia

10.1.10

Fio de lua


Deixei uma barca à deriva e
Pendurei-me na lua, em corda bamba de abismo
E esperei pela maré alta que viria do teu luar
A noite era de prata, o mar era de sargaço
Só tu tardavas...
Por momentos quis cair na água
Mas a lua não me quis perder
E tu que tardavas.
E a barca das ilusões, aquela que vive perto da dos amantes,
cobriu-se de um pano branco, exangue, solene
à espera da tua chegada.
E tu que tardavas em vir,
descoberta pela noite fora, envolvida pela noite dentro,
sôfrega do tempo que, afinal, nunca te dei...
Já passavam das quatro.
Quase à beira das oito.
E, nesse instante, senti que te tinha perdido:
que a barca nunca iria se encher do teu riso,
que a lua nunca iria vibrar com o teu pranto,
que o fio nunca iria quebrar-se pelo meu peso.
Foi nessa altura, perto do amanhecer mais tardio que alguma vez conheci,
que me deixei cair,
à espera que a barca não me amparasse a queda,
à espera que a lua não se zangasse, afinal,
à espera que tu tardasses ainda mais até nunca mais...
Nessa hora, a nona daquela noite,
levantei a âncora da minha ira
E, em silêncio, rumei para sul,
sem esperar pela gaivota esfaimada que todas as manhãs por ali irrompia, sem piedade,
sem atender à dor que a ausência das tuas águas felizes me fazia sentir.
Se um dia passares por esse fuso horário,
por esse pedaço de mar,
e por essa réstia de lua,
não perguntes por mim -
não deixei endereço e parti para parte incerta.
Se a barca aí ainda estiver,
recolhe o pano,
procura a lágrima,
enrola o fio de prumo que a lua tem para te oferecer.
E vai
Vai e não voltes.
Que eu... já não sou deste mar.

5.1.10

A voz e as palavras

Sou Mulher. Adulta. Senhora. Às vezes soturna. Tantas vezes ufana.
Tenho uma voz e revejo-me nas palavras, ditas e reditas por mim, através de mim e pelos outros.
Hoje apeteceu-me um pedaço de estrofe, um naco de poema vadio, uma fatia de romance de erva-doce ou de cordel.
Quero-me sensata, inquieta, imprevisível, desassossegada na minha habitual pacatez, metafórica, feita daquelas águas claras que irrompem das minhas almas, sem aviso, sem surpresa.
Leiam-me, Ouçam-me, decifrem-me, Soletrem-me....E ensinem-me as mágoas das flores, perto das magnólias que florescem antes de dar folha.
Não me atirem correntes mas antes gotas de chuva.
Quero a mansidão das manhãs de Outono, a fúria dos escorpiões, os risos surdos de Charlot, as garças dos vossos sorrisos...

As palavras, vagabundas e libertinas, trocam-me as mãos com o seu galope e afugentam os meus demónios. E correm, velozes, em busca do meu trote...Onde estás, cavalo meu?... à solta no meu peito, perto do canto mais estreito dos meus dedos, longe da esquina mais larga do meu espanto.
Quem te deu asas, quem te feriu de voz e pena, quem te trouxe encavalitado na minha dor, quem te fez meu, mesmo sem asas?

Queria escrever algo para espantar as tempestades
Deixem-me usar uma pena de outros tempos
Deixar recados por histórias antigas e dolentes e
Encontrar violinos debaixo das pedras da calçada...
A mão segue implacável, sem controlo, sem razão,
sem que eu a consiga deter.
Parem-na se quiserem.
Eu... nunca a deterei.
Por amor ao papel.
Ao branco grávido e vazio
Às linhas incontáveis dos meus cadernos da infância
Aos livros que li sem perceber
Às sebentas que preenchi com lenga-lengas
Por missão e
Por recato da minha imaginação.
Sou voz. E uso palavras.
E estou aqui a apresentar-me.
Obrigada por estares aí. Ainda. Obrigada por terem estado aí.....
enquanto cultivei A VOZ E AS PALAVRAS