Boa noite.
Hoje dizem que esta gala tem a idade maior.
É maior de idade.
Tem a maior das idades.
Sim, a minha, é também uma idade maior, aquela que está mais próxima da ternura de não mais querer os anos que passaram mas não conseguir fazer nada sem a memória deles.
A idade é maior porque tinha 20 anos quando Nixon assinou a retirada do Vietname, quando o flower power passava de mão em mão, de peito em peito, de viola em viola, maior argumento para quem se deu a tudo o que de novo chegou, para quem verteu as últimas lágrimas de napalm, para quem acreditava que havia uma só cor no Mundo e uma só balada de café triste – aquele que irrompia do dolente canto de Bob Dylan, da voz interventiva de Joan Baez, do cântico mais solene de Martin Luther King.
A Lua estava ali à nossa espera, com o mar da sua tranquilidade espantando os nossos medos e enfurecendo as iras de mil e uma odisseias no espaço.
Kennedy, dividindo o seu coração entre Jackie e Marilyn, era assassinado como uma qualquer pomba de botequim, como se não houvesse nada mais do que Dallas em 1963.
A crise do viúvo petróleo abalou o oriente e a praia de eleição era Copacabana.
Com o 25 de Abril, foi o salve-se quem puder! As casas do Algarve deixam de pertencer aos donos e a moda passa a ser o Leblon e o Rio de Janeiro.
Os fatos de banho e os biquinis eram de licra cada vez mais reduzidos e a ideia de proteger a pele começou a ganhar forma.
O maior sucesso comercial era conseguido pela Mercedes com os 280 e 350 SL, enquanto a Wolkswagen “carocha” continuava o seu sucesso até ao fim da década.
Os manos Gibb dos Bee Gees dominavam os TOPs e venderam 30 milhões de cópias com a banda sonora do filme “A Febre de Sábado à Noite”, soltando gritinhos disco e atropelando as pistas de dança.
Arautos do rock progressivo, os Pink Floyd deslumbraram alguns (enquanto que para outros eram uma fantochada), exortando os professores para deixarem os alunos em paz…
Simon and Garfunkel receberam meio milhão de almas para uma farra no Central Park, perto da mesma avenida em que anos mais tarde uma bala perpassou o coração de John Lennon.
Na década de 80, Chernobyl e Gorbachov deixaram a Europa de rastos e caíram muros. Uns de vergonha. Outros de junquilhos.
Foram os anos da proveta, da sida e dos portáteis.
Madonna usou a própria sensualidade até à exaustão e Michael Jackson foi durante algum tempo o homem mais famoso da Terra. Em 1982, o álbum Thriller esgotou 40 milhões de cópias, passando a ser o álbum mais vendido de sempre.
O nudismo, apenas o lado mais genuíno e cru de todos nós, passou a ser completamente livre. E o surf tornou-se uma instituição em Portugal.
Bruce Springsteen foi «The Boss».
Kate Bush cantou os ventos uivantes.
Dizíamos todos, em uníssono, que tínhamos nascido para viver (born to be alive).
Era uma idade maior aquela que tínhamos guardado na gaveta do nosso espanto e na certeza de que o mundo pulava e avançava nas mãos daquela criança que, um dia, colocara um cravo na boca da espingarda que Abril não conheceu.
É esta a hora.
A que ainda temos para viver.
A que sonhamos ainda querer.
A que nos cabe inteira na palma da nossa mão estendida.
A que nos veste de gala para hoje estarmos aqui.
(…)
Teerão
Há 2 horas
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