4.11.11

Monólogo de uma mulher moderna

"São 5.30H da manhã, acordo e já não consigo dormir...
Estou acabada. Não quero ir trabalhar hoje.
Quero ficar em casa, a cozinhar, a ouvir música, a cantar, levar os cães a passear
pelos arredores. Tudo menos sair da cama, meter a primeira e ter de por o cérebro a funcionar.
Gostava de saber quem foi a besta da bruxa imbecil, a matriz das
feministas que teve a ideia de reivindicar os direitos da mulher e
porque o fez connosco que nascemos depois dela?
Estava tudo tão bem no tempo das nossas avós, elas passavam o dia todo
a bordar, a trocar receitas com as suas amigas, a pintar,
ensinando-se mutuamente segredos de condimentos, truques, remédios
caseiros, lendo bons livros, decorando a casa, podando árvores,
plantando flores, recolhendo legumes das hortas e educando os filhos.
A vida era um grande curso de artesãos, medicinas alternativas e de
cozinha.
Depois ainda ficou melhor, tivemos os serviços, chegou o telefone, as
telenovelas, a pílula, o centro comercial, o cartão de credito , a
Internet! Que maravilha que seria ter a vidinha das nossas avós com a
tecnologia de hoje....upa upa...!
Quantas horas de paz a sós e de realização pessoal nos trouxe a tecnologia!
Até que veio uma tipa, que pelos vistos não gostava do corpinho que
tinha, para contaminar as outras rebeldes inconsequentes com ideias
raras sobre "vamos conquistar o nosso espaço" Que espaço?! Que caraças!
Se já tínhamos a casa inteira, o bairro era nosso, o mundo a nossos pés!!! Tínhamos o domínio completo dos nossos homens, eles dependiam de nós, para comer, vestirem-se , para terem sucesso e para parecerem bem à frente dos amigos. E agora? Onde é que eles estão??? Nosso
espaço???!!! Agora eles estão confundidos, não sabem que papel desempenham na sociedade, fogem de nós como o diabo da cruz. Essa piada..., acabou por encher-nos de deveres.

Antigamente os casamentos eram para sempre. Porquê? Digam-me porquê?
O sexo feminino, que tinha tudo do melhor que só necessitava de ser frágil e
deixar-se guiar pela vida começou a competir com os machos? Para eles
agora, uma relação são 15 minutos de sexo rápido e depois desaparecem durante duas semanas para verem futebol, beber cerveja e...trabalharem apenas para si.

A quem ocorreu tal ideia? Vejam o tamanhão dos bíceps deles e vejam o
tamanho dos nossos!
Estava muito claro que isso não ia terminar bem. Não aguento mais ser
obrigada ao ritual diário de ser magra como uma escova, mas com as
mamas e o rabo rijos, para o qual tenho que me matar no ginásio, ou de
juntar dinheiro para fazer uma mamoplastia, uma lipo, ou implantes nas
nádegas... Além de morrer de fome, pôr hidratantes, anti-rugas,
padecer do complexo do radiador velho a beber água a toda a hora e
acima de tudo ter armas para não cair vencida pela velhice,
maquilhar-me impecavelmente cada manhã desde a cara ao decote, ter o
cabelo impecável e não me atrasar com as madeixas, que os cabelos
brancos são pior que a lepra, escolher bem a roupa, os sapatos e os
acessórios, não vá não estar apresentável para a reunião do trabalho.

E não só, mas também ter que decidir que perfume combina com o meu
humor, ter de sair a correr para ficar engarrafada no transito e ter
que resolver metade das coisas pelo telemóvel, correr o risco de ser
assaltada ou de morrer numa investida de um autocarro ou de uma mota,
instalar-me todo o dia em frente ao PC, trabalhar como uma escrava,
moderna claro está, com um telefone ao ouvido a resolver problemas uns
atrás dos outros, que ainda por cima não são os meus problemas!!! Tudo
para sair com os olhos vermelhos - pelo monitor, porque para chorar de
amor não há tempo! ... e ainda ficamos agradecida quando entram em
nossa casa, sentam-se no sofá, vêm as notícias, contam-nos coisas
sobre os seus amigos, comem o nosso jantar, arrotam e vão embora.

A maior preocupação passara a ser essas piranhinhas de 18~20 anos que
não querem saber de emancipação, e que querem mesmo é um homem de 40
anos sossegado em casa que lhes dá tudo aquilo que nós rejeitamos.

Somos mesmo estúpidas. E olhem que tínhamos tudo resolvido, estamos a
pagar o preço por estar sempre em forma, sem estrias, depiladas,
sorridentes, perfumadas, unhas perfeitas, operadas, sem falar do
currículo impecável, cheio de diplomas, de doutoramentos e
especialidades, tornámo-nos super-mulheres mas continuamos a ganhar
menos que eles e de todos os modos são eles que nos dão ordens!!!!

Que desastre! Tão estúpidas que podíamos ser isto tudo com o homem a
trabalhar para nós. Basta!!! Quero alguém que me abra a porta para que
possa passar, que me puxe a cadeira quando me vou sentar, que mande
flores, cartinhas com poesias, que me faça serenatas à janela! Nós
sempre soubémos que tínhamos um cérebro e que o podíamos utilizar para
quê a estúpida mania de o demonstrar??

Ai meu Deus, são 6.10H, e tenho que levantar-me da cama... Que fria
está esta solitária e enorme cama! Ahhhh... Quero um maridinho que
chegue do trabalho, que se sente ao sofá e me diga: Meu amor não me
trazes um whisky por favor? ou: O que há para jantar? Porque descobri
que é muito melhor servir-lhe um jantar caseiro do que atragantar-me com uma sanduíche e uma Coca-Cola light enquanto termino o trabalho que trouxe para casa.
Pensam que estou a ironizar ou a exagerar? Não minhas queridas amigas, colegas inteligentes, realizadas liberais....e idiotas! Estou a falar muito seriamente:
"Abdico do meu posto de mulher moderna." Nós é que liberamos os homens
das suas obrigações.

E digo mais:
A maior prova da superioridade feminina era o facto de os homens
esfalfarem-se a trabalhar para sustentar a nossa vida boa!
Agora somos iguais a eles! Que merda...
Ai ai!!!

Que booooommmmmmmmmm............foi apenas um sonho........!
Agora passeio os cães e rebolo com eles na relva e sinto o cheiro da terra molhada.... TODOS OS DIAS, e não preciso da base nem do rímel nem dos saltos altos.

Agora posso brincar contigo Gonçalo.

1.11.11

Paternal

"Filho é um ser que nos emprestaram para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos, de como mudar nossos piores defeitos para darmos os melhores exemplos e de aprendermos a ter coragem. Isto mesmo! Ser pai ou mãe é o maior ato de coragem que alguém pode ter, porque é se expor a todo tipo de dor, principalmente da incerteza de estar agindo corretamente e do medo de perder algo tão amado. Perder? Como? Não é nosso, recordam-se? Foi apenas um empréstimo".
 
José Saramago